Fim de ano é tempo de analisar o já famoso 2020. Famoso e mal falado, digamos, para falar a verdade: As pessoas, muitas delas, engordaram, e põe a culpa na Pandemia. Mas pior que isso, os professores e a Ciência foram mais menosprezados do que eram antes, a arrogância o preconceito e o racismo mostraram sua cara – com ênfase nunca visto. A intolerância tomou espaço do diálogo e a ignorância do negativismo, consciente e/ou involuntário é a segunda Pandemia, num só ano! A sensação inicial da retrospectiva 2020 é de que estamos regredindo.
“Culpar os outros” por nossas falhas é um pretexto popular que faz muito sucesso para justificar o que nos desagrada: ”Engordei por conta da Pandemia”, justificamos por aí. Mas na verdade engordamos por que passamos a comer mais, talvez pela ansiedade com a Pandemia, mas ainda assim, o motivo real é comer bem mais que antes. Poderíamos dissipar a ansiedade de várias outras formas – inclusive praticando exercícios físicos. Mas é mais fácil ‘botar a culpa’ na Pandemia, ou seja: Nos outros!
Mostrar sabedoria, conhecimento, informação até tempos atrás era mais fácil, acredito eu. Hoje contesta-se tudo e mesmo que se ateste que uma informação foi “cientificamente provada”, isso não basta mais para convencer muitos dos ouvintes. A ciência, o conhecimento gerado pelo bicho Homem (até a pouco chamado de Ser Humano), está sob fogo cruzado. E mais de 10% dos brasileiros, esses elementos que já foram considerados “cordiais”, acreditam que a terra é plana! A “nova sabedoria” dispensa provas e estudos. É só acreditar!
Basta surgir uma nevasca intensa, em pleno inverno de região fria, algo que acontece todos os anos, por exemplo, para alguém, fundamentado apenas na nevasca achar que isso basta para contestar e negar o aquecimento global. E dizer que isso de aquecimento é balela de comunistas – que a maioria sequer saber dizer quem são eles. Ignoram que tal raciocínio apenas reforça a estratégia de grandes conglomerados de empresas dependentes do petróleo, combustível fóssil e finito, cuja queima está acabando com o Planeta Terra, via efeito estufa! As aparências, aquilo que o olho humano consegue ver, vale mais que a Ciência.
Tempos atrás escrevi aqui mesmo algo que ouvi de pessoa com vasta e insuspeita bagagem intelectual, com mestrado e doutorado na área ambiental. Ele me garantiu que se estudarmos a História da Humanidade veremos que existiram períodos em que, claramente, a sociedade humana regrediu, andou para trás, e depois retomou o caminho da evolução. Esse amigo acredita que estamos passando por um desses períodos de retrocessos, de negação da Ciência, do conhecimento e até da razão. Paralelo a isso, meus botões e eu não temos dúvidas de que o atual boom da religiosidade tenta, muitas vezes, substituir o saber da Ciência pelas “graças de Deus”. Vale o que eu escuto na Igreja, e não o que está nos livros de conhecimento humano, devidamente comprovados na prática, por muitos anos!
Mas vamos lá novamente para o 2020 que está no fim: Particularmente o que me surpreendeu neste ano foi o grande número de pessoas estudadas, donos de diplomas profissionais e, entre estes até alguns muitíssimo bem-sucedidos em seus negócios, que resolveram dizer com todas as letras o que pensam e no que acreditam. E o que disseram… Não vou dizer que foi uma decepção geral, porque alguns se salvam. Mas a maioria acredita em mitos, em coisas imaginárias, nas quais lhes convém acreditar para “comprovar” seus conhecimentos de “ouvi dizer”- e nada mais que isso! Sabia que de iletrados não se pode esperar grande conhecimento da realidade, é óbvio. Mas pessoas “com estudo” dizer que vacina chinesa “mexe no DNA” da pessoa vacinada, aí não dá para aguentar!
Essa surpreendente crendice de mexer no DNA através de uma vacina é de um absurdo que vai daqui à Sibéria, ou a Mongólia, que fica lá para os lados da China! E meu amigo interlocutor portador da desinformação me garantiu, como prova de sua veracidade, que ouviu isso “de um epidemiologista”. E ponto final, para ele: Então é verdade! Era um antiquíssimo “dito”, anos atrás, dizer que “o papel aceita tudo”, para alertar que inverdades e falsidades poderiam ser facilmente escritas. Hoje com a Internet o papel quase sumiu de nossas vidas, mas já podemos atualizar o dito: Nem tudo o que sai na Internet é verdadeiro!
Semana passada também vi no Facebook outro amigo – igualmente “formado na faculdade”, como dizem – publicar depoimento do Ex-ditador João Batista Figueiredo, chamando a ditadura militar brasileira de 1964 a 1988 – que matou e torturou nem se sabe quantos, até hoje – de “Democracia”! Sinceramente essas “tristes revelações” me deixam assustado e decepcionado. Quem viveu e acompanhou a chamada “redemocratização” do Brasil pós ditadura, acredito eu, não consegue digerir nem muito menos ler sem se indignar tamanha heresia negacionista. Daqui a pouco vão ressuscitar o “milagre brasileiro”, uma grande farsa, hoje motivo de piadas. Mas à época, o tal milagre, obra do Ex-ministro da Fazenda Delfim Neto, foi exaustivamente louvada e aplaudida pela imprensa e pelos grandes empresários – que logo depois caíram na real, numa inflação nunca antes vista. E com um país em pandarecos!
Quer dizer, para mim a palavra do ano é “decepção”, tanto com alguns amigos (não todos, ainda bem) como com milhões de desconhecidos. Mesmo assim a palavra para 2021 é “esperança”! Nunca desisto, e acredito – não me perguntem como – que o próximo ano será bem melhor que o atual, ao contrário do que dizem muitas previsões de astrólogos-de-fim-de-ano. Acredito, primeiro, porque a Ciência há de dar um jeito de, ao menos, controlar a Pandemia (da Covid19) e impedir seu crescimento, através de vacinas. E tem o lado bom (sempre tem!) da Pandemia: As fragilidades da sociedade humana no planeta, evidenciadas pela mutação de um vírus invisível, talvez sirvam para frear a arrogância, a discriminação, o racismo e os preconceitos de muitas pessoas que acham que sabem tudo. E essa é outra Pandemia, ainda sem vacina. Nem remédio! Mas precisamos manter, pelo menos vivos, o otimismo e a esperança!
Quirera Gourmet