Vem aí a Semana da Pátria sem aglomeração, nem desfile da Independência, nem Xanxerê em massa na Passos Maia – única oportunidade em que se pode ver, junto e reunido, o tal povo xanxerense – um personagem muito admirado, abraçado e festejado em anos eleitorais, especialmente. O desfile do dia sete é a maior concentração coletiva de povo na rua, na Campina da Cascavel. Neste ano da peste não vai ter, mas o desfile traz muitas recordações aos nativos, algumas bem hilárias. Lembro de uma, no desfile do dia sete de setembro de 1992 quando, dias antes, o então Presidente Fernando Collor realizara comício na Praça Tiradentes – já em meio ao tiroteio nacional do impeachment. Veio dar apoio ao prefeito, maior apoiador de Collor em Santa Catarina, e também ao seu candidato a prefeito, que não venceu a eleição. Na época, jovens mulheres e homens xanxereenses (eu no meio), formaram o grupo “Geração Mudança”, de apoio ao candidato Julio Cesar Bodanese (PMDB), que venceu a eleição com uma diferença de votos até hoje nunca igualada. No comício fotografamos Collor abraçado ao então prefeito de Xanxerê (ambos do PRN), também ao lado de seu candidato a prefeito, do PDS (Ex-Arena). As fotos renderam um famoso panfleto na base do “dize-me com quem andas e dir-te-ei que és”, distribuído aos milhares pelo Geração Mudança durante o desfile, na Passos Maia…
O “Geração Mudança” fez furor. Foi o fato mais marcante da campanha, por agregar mais de uma centena de integrantes, gratuitamente e alguns, recém-formados, colaborando com grana, tempo e trabalho para as ações de campanha do grupo. Tudo para pregar que estava na hora de mudar: Até aquela eleição, praticamente o mesmo segmento político partidário de Xanxerê havia ganho TODAS as eleições municipais, primeiro com a Arena depois com PDS/PFL. O discurso de mudança colou, “pegou parelho”…E Julião Bodanese fez mais de 60% dos votos, algo inédito, até hoje. Mas o engraçado, cômico mesmo, aconteceu durante aquele desfile do dia sete, em 1992, que contou, como é praxe, com prefeito, vereadores e convidados em cima do palanque montado em frente à (hoje) Farmácia Drogacentro. Na calçada de toda a Passos Maia, enquanto isso, o Geração Mudança panfleteava à vontade, para desespero dos passageiros do palanque, que também tinha, como sempre, um locutor oficial anunciando escolas e entidades do desfile. Repito, o ano era 1992, apenas quatro anos após a promulgação da nova Constituição, e ainda pairava no ar de Xanxerê e do Brasil muitos resquícios da ditadura militar, de tenebrosa lembrança. Também como era comum, o locutor dava suas “escorregadelas” para aplicar na veia um jeitinho brasileiro e puxar uma brasa para os candidatos do PDS/PRN, disfarçadamente. Lá pelas tantas, porém, o mesmo locutor acusou a certeira pontaria da panfletagem em curso…E mandou no microfone, em alto e bom som, mais ou menos o seguinte: ”Atenção xanxerenses, senhoras e senhores. Cuidado! Um grupo de elementos subversivos, comunistas, está distribuindo panfletos tentando denegrir nosso desfile em homenagem à pátria! Cuidado com eles! Aqui não é hora de fazer política”…
As palavras não foram exatamente estas, mas a mensagem era exatamente nesse sentido! À época ninguém sabia nem imaginava o que viria ser “Fake News”, mas aquela certamente foi a primeira que ouvi… Nenhum dos integrantes do Geração Mudança era subversivo, nem perto disso! E o panfleto estava a léguas de distância de se parecer com algo produzido por comunistas. Só alertava que os adversários do Geração Mudança eram correligionários de Collor de Mello, então às vésperas de ser apeado da presidência, que acabou por renunciar para não ser cassado. Não guardamos ódio por sermos taxados de subversivos, nem de comunistas. Até rimos e nos sentimos importantes!… Já naqueles anos e antes disso quem ousasse ser oposição aos governos militares e a seus seguidores estaduais e municipais costumavam ser rotulados de comunistas. E a fama, lá e agora, era de que comunista comia criancinha (ao molho pardo), que iria tomar conta da sua propriedade, “dividir sua casa com os pobres” e tirar tudo o que você, “Cidadão de bem”, honesto e trabalhador tinha conseguido com muitos anos de trabalho…
Os comunistas eram (e hoje ainda se diz isso) vistos como monstros, pessoas contra Deus e contra a família… Traduzindo em miúdos, poderia se dizer, hoje, que comunista era “mais feio que o cocô do cavalo do bandido”. Note-se que também em 1964, ao depor o Presidente João Goulart, os militares bateram na mesmíssima tecla que batem hoje: Quem apoiasse Jango, Brizola e outros era comunista, e os comunistas queriam tomar conta do Brasil! Pior que também essa Fake News foi que muitíssimos dos “cidadãos de bem “ e até cidadãos “nem tão virtuosos”, digamos, acreditaram (e acreditam até hoje) nessa balela histórica! E até agora enxerga-se comunistas em qualquer um que minimamente ouse fazer críticas a governos e a desgovernos, como o brasileiro, atual! E igualzinho aos tempos de agora, comunistas eram tão perigosos que se escondiam até atrás do vaso sanitário! Um perigo! É importante salientar isso, pois ao menos oficialmente estamos (e em 92 estávamos) numa democracia. Cumpre apenas detalhar uma coisinha à toa: Comunistas, o partido comunista e seus seguidores existem em praticamente todo o mundo, até nos Estados Unidos.. mas não comem criancinhas, são cidadãos comuns, alguns até religiosos, até católicos. Mas é verdade, sim, que o comunismo não deu bom resultado em país algum do mundo. Porém também é verdade que taxar de comunista qualquer pessoa que faça críticas a governos estaduais, municipais ou ao desgoverno que nos assola, nada tem a ver com ser comunista. Aos que quiserem continuar chamando, estejam à vontade! Eu, ao menos, não me incomodo, e nunca me incomodei, só acho engraçado! Isso é só uma informação, para ninguém continuar a vestir a carapuça de ignorante político…
Embora naqueles anos de 1992 eu fosse apoiador do PMDB, cumpro o dever de informar que hoje não sou mais. Na verdade, sempre me identifiquei com partidos de esquerda, desde os 14 anos, mais ou menos. E naqueles anos para mim, o PMDB era de esquerda. Hoje, olhando para o mesmo partido, agora sob a sigla MDB, impossível taxá-lo como partido de esquerda. O PMDB de esquerda morreu com Ulisses Guimarães. Para mim hoje, com muita boa vontade, o partido é de centro direita, com claríssimas tendências à direita. E embora eu siga mantendo, desde sempre, minha condição de não-filiado a partido algum – da qual não pretendo me afastar – vejo apenas um partido, hoje, que pode ser chamado, com alguma boa vontade também, de esquerda: O PSol. Nem o PT, que também abriga em suas fileiras personagens e posicionamentos de direita é de esquerda, hoje. Se por muitos anos mantive ceticismo radical em relação aos partidos políticos brasileiros, hoje, mais que nunca, não consigo acreditar em algum deles! E aos que, talvez, queiram saber o que entendo por ser de esquerda, adianto a resposta, que copiei do Ex-presidente Uruguaio José ”Pepe” Mujica: “Ser de esquerda é uma posição filosófica perante a vida, onde a solidariedade prevalece sobre o egoísmo”. Note que uma “posição filosófica perante a vida” é algo bem mais amplo que uma simples posição política, ou partidária. Mas para concluir: Ainda tenho o maior orgulho (e saudades) do Geração Mudança e de seus “subversivos”! E guardo muito apreço por todos que ajudaram a construir o mais poderoso movimento político da juventude xanxerense. Nunca houve nada igual. E não vejo na rapaziada de hoje nenhuma possibilidade de se reeditar um movimento parecido com aquele, para qualquer lado, infelizmente…