Nós – os de 60 e muitos, estamos com mais da metade da estrada já percorrida, com certeza, se ninguém encontrar a fonte da juventude, meio logo. Se olharmos para os mais velhos – aqueles que acostumamos a ver, desde pequenininhos, e eles já se foram todos, ou a maioria. Dos avós e tios não tenho mais nenhum e só uma das tias ainda está em atividade, as demais também bateram asas rumo ao paraíso – dizem os primos mais antigos. Os primos veteranos e irmãos mais velhos batem na casa de 70 e poucos, para mais. Assim, e “no popular”, é impossível negar: Está chegando a nossa vez! Ou “É nóis na fita”! De uns três anos para cá começaram a morrer vários amigos da nossa idade e mais novos, algo que era raro acontecer. E agora nem assusto mais quando alguém me chama de senhor, ou de tio….
Sempre nos avisaram que a vida era curta, que passava num vapt-vupt. Mesmo assim, da parte que me cabe achei que foi mais rápido que seria razoável esperar – se é que nos é dado o direito de, ainda, reclamar. Por outro ângulo, não tenho certeza se nos tempos atuais ainda valha a pena ficar assistindo o que rola no planeta: Só tem notícia ruim. E definitivamente, nossos ídolos morreram (quase) todos, sem deixar substitutos. Então é preciso deixar o mundo para lá e navegar no modo “faz de conta”, espécie de modo avião, sem avião. Até porque ficar triste ou lamentar tanta estrada já percorrida seria o equivalente a desvalorizar e menosprezar lutas vitoriosas e heroicas batalhas, para chegar até aqui. Muitos, não chegaram!
E se estamos aqui, aproveitemos o que nos resta de bom. E tento até mesmo levar a parada “nessa batida” – a de não esquentar as parafusetas, as bielas e as rebimbocas. Mas é difícil, porque se a gente não se incomodar mais com nada e decretar a “Dolce Vitta”, dia-e-noite, de segunda a segunda, o cotidiano ficaria intragável, insuportável, impraticável e outros adjetivos do tipo. Por essas e muitas outras, o Senhor das esferas nos equipou com a tal criatividade. Daí então a gente olha para a trincheira e analisa nossas chances nas batalhas que ainda estão pela frente. E é necessário lutar ou, ao menos, fazer barulho, porque cruzar os braços e só apreciar a (cada vez mais feia) paisagem também não serve! Assim como não cabe mais engrossar o caldo e – dançando conforme a música – partir para a ignorância!
E por mais que a gente cultive, agrade, faça gosto e desenvolva intimidades com a paciência, as vezes ela acaba, isso não tem jeito e, acredito, deve ser um efeito colateral da Pandemia. Mesmo sem tomar cloroquina, Ivermectina nem gasolina! Ainda não cheguei à conclusão se os anos 60 e muitos nos conferem mais tolerância ou mais intolerância – especial e principalmente quando topamos com explícitas manifestações de ignorâncias, várias e bem conhecidas. Às vezes acho magnífico conseguir fazer de conta que não escutei e seguir adiante – ignorar ignorâncias é uma arte nobre! Mas em outras considero oportunidades excelentes demais para serem desperdiçadas, deixar para lá. É preciso ter esperança, e esboçar alguma reação, ao menos para espantar o conformismo e os desânimos. Desesperar, jamais! Aprendemos muito nesses anos…
E nos 60 e muitos, surpresas de vários amigos próximos morrendo nos “lembram” que a vida é um sopro, uma leve brisa, quase nada. E a Pandemia barateou o conceito de morte, ela se popularizou no ar que respiramos, parece que ficou mais próxima de todos, e que leva as pessoas embora com muito mais facilidade. Nunca foi tão fácil morrer, dá até para se dizer isso! Antes era preciso estar, ou ficar de repente, muito mal de saúde. Na Pandemia não é tanto, mas morrem pessoas, mais que antes. A Covid 19, além de ser totalmente nova, banalizou a morte. Tirou dela, inclusive, todo o ritual: Não há mais velórios, nem enterros no formato que existiam. O que há é o medo de contrair o vírus – que está ali, no corpo do amigo querido, dentro do caixão, que precisa ser rapidamente enterrado.
Ao lembrar de amigos que se foram, antes da Pandemia, dá para brincar com eles: “Viu só do que vocês escaparam? ”… O ineditismo de uma peste mundial já catapultou a Pandemia como a marca do Século XXI, que ainda nem percorreu 30% do seu tempo. E ainda não sabemos qual será o fim dessa viagem inesperada, indesejada e reveladora da surpreendente e enorme fragilidade da vida Humana na Terra. Logo nós, os únicos seres racionais, estamos literalmente com as calças na mão… Mesmo com toda a tecnologia, com todas as armas, com todas as fortunas e demais parangolés e salamaleques de nossa ostentosa e decantada superioridade. Não somos apenas “uns boçais” – como cantou o Poeta Cazuza. Agora enxergamos que, além de boçais, nós os de 60 e poucos somos a bola da vez. Com ou sem Pandemia, vale frisar.
Tentar ver, sem emoções fortes, o famoso “lado bom da coisa” é uma alternativa. Resta dizer que também passei a encarar a morte com outros olhos, talvez para seguir a onda do “novo normal”. Do pó viemos, ao pó voltaremos, simples assim, sempre soubemos disso. E nada nos autoriza por enquanto acreditar que isso algum dia vá mudar. Aproveitar o que der, enquanto ainda não vierem nos dizer que “acabou-se o que era doce” também pode ser divertido, e acredito que acalme os espíritos que nos seguem, há décadas. Se não foi possível ficar milionário, nem famoso, penso que é suficiente constatar que não morremos antes, nem depois, nem mais pobres, nem mais ricos, nem por engano. Morre-se quando se tem que morrer. E dizem, isso nunca vai mudar!
Números de ontem apontam 69.282 mortes com a Pandemia em todo o Brasil, SÓ no mês de abril, até agora. Além de ser o mês com maior número de óbitos, os números dos quatro primeiros meses de 2021 somaram mais mortes do que todo o ano de 2020. E pelo andar da teimosia ainda teremos que lamentar milhares de mortos. Porque muita gente não acreditou, não acredita e nem vai acreditar na Ciência, e nem nos números aterradores, no mundo inteiro. Fanatismo, negacionismo, ignorância e radicalismo religioso, daqueles que acreditam que Deus, o seu Deus, tudo pode e tudo resolve, acima e mais que a Ciência. Milagres? É claro que existem. Mas não acontecem todos os dias, e nunca ocorreram centenas, nem milhares deles assim, como muitos acreditam e esperam acontecer. Aos que acreditam na Ciência e sabem “com quem estamos lidando”, resta reforçar: Cuidado! Máscara! Álcool Gel! Sem aglomerar! E Vacina! Não existem outros tratamentos!