Hiper Badotti 93017
18/06/2020 às 08:01
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Quirera Gourmet – 18/06/2020

Quirera Gourmet

Voos de Quarentenas. E Outras Boas Viagens !

Entrei no elevador e apertei no cinco, endereço da caverna, onde dá para tirar a máscara nessa droga de quarentena que não termina nunca. Mas antes do elevador sair do lugar a porta reabriu e entrou uma linda mulher, morena, de máscara branca, com o corpo envolvido em panos leves, coloridos, esvoaçantes…achei que era uma tigresa, de unhas negras e íris cor de mel…. Ela apertou no décimo terceiro. No entorno dela veio uma névoa invisível e bem-cheirosa, que enfeitiçou o ar, ignorou máscaras e desfilou pulmão adentro até rachar o caminho do coração – por onde disparou alarmes, buzinas, campainhas e sirenes.  A sereia de longos cabelos cacheados sorriu com grandes olhos verdes e veio nadar comigo, que sou de peixes e adoro boas companhias, pensei. O bom dia dela teve fundo musical com piano, acho que era Pour Elise, de Chopin, mas não tenho certeza, nas nuvens a gente nem percebe direito. E porque ela disse “desculpa te atrasar”. Falei “que nada, vamos navegar juntos nas alturas”. Ela sorriu com lábios que imaginei uns daqueles tsunamis lá do Havaí. Ela riu e avisou que sabia nadar, “mas voar ainda não aprendi”… Faz mal não, falei, que o condomínio proíbe revoadas dentro do elevador, “mesmo com plumagens coloridas cheirosas, e muito bonitas…”. Ela ignorou a gracinha, mas prosseguiu. Falou que veio ver um apartamento, precisava de um lugar para morar aqui em Xanxerê.

Aí o inconveniente elevador abriu a porta no quinto andar, mas eu nem me mexi. “É o seu andar”, ela avisou – e eu notei um milímetro de “que pena” naqueles incríveis olhos verdes, brilhantes… Não vou descer aqui, eu disse. E com Tico e Teco trabalhando turbinados mandei ver:  “Faço parte da comissão de boas-vindas aos novos moradores. Vou acompanhar seu voo até a árvore do seu destino seguro, posso? ” . Aí o sorriso dos seus olhos se expandiu tipo lua cheia, disse “é claro! “, e veio junto um “nossa, quanta gentileza! Hoje é raro ouvir palavras assim… ainda mais dentro de elevador e em plena pandemia”. Olhando bem nos seus olhos tratei de jogar água na fogueira: “Verdade, mas não me interprete mal, com a pandemia ando carente de papos informais, sem aviso prévio, você me surpreendeu…e sou Jornalista, adoro conhecer pessoas, ouvir e conversar com desconhecidos…ainda mais com mulheres lindas. E mais ainda agora sabendo que vais morar aqui. Nosso condomínio tem muita gente simpática, e tem vaga para mais… e aqui todos prezam pelo respeito ao espaço de cada um, então desculpe se a importunei…”.

Ela olhou para o marcador de andares, respondeu com um protocolar “imagina, não importuna. Ao contrário, parece ser um bom papo, apesar de ser jornalista. Não gosto de jornalistas, acham que sabem tudo, mas não é o teu caso, pelo jeito…”. O elevador voltou a voar e ela se calou como quem vai dar um “foi bom te encontrar, até mais, a gente se vê por aí”. Mas errei feio: Quando o elevador parou, ela saiu e segurou a porta aberta, dizendo “bem, se você é da comissão de recepção, talvez possa me acompanhar, me mostrar o apartamento, e me contar mais sobre o condomínio e sobre Xanxerê. Pode ser? ” Tico e Teco ficaram sem galho debaixo dos pés, mas reagimos bem: “Poxa, gostaria muito mesmo, mas a faxineira lá de casa deve chegar daqui uns minutos e preciso abrir a porta para ela entrar…, Mas, quem sabe você me acompanha até lá, abro a porta e a gente volta aqui…E arrematei: “Nosso papo de elevador merece prorrogação, você não acha? ” Aquele olhar verde e luminoso quase gargalhou e se espraiou novamente, em ondas de um suave alívio e trouxe um “legal, então vamos até lá”. E voltou ao elevador. Me deixou como quem já acertou quatro números da megasena….

Em seguida ela disse “desculpe a curiosidade, mas sou nova aqui na cidade, não conheço ninguém e nunca tinha estado aqui no Oeste catarinense. Sou do Ceará e vou trabalhar aqui por seis meses ou um ano. Você conhece Fortaleza?”.  Falei que não conhecia. E que ela também era a primeira cearense, que eu soubesse, a pôr seus pés em praias xanxerenses….”Nossas praias não têm mar, mas sereias, às vezes, aparecem,”, eu disse, rindo. Ela respondeu com um olhar egípcio sensacional!  E eu contei que ouvira falar da praia de Jericoacoara, “que dizem ser muito bonita. Um dia quero conhecer…”. Olha!! – exclamou ela rindo – “meu Deus quanta coincidência, é bem lá que eu moro, ou pertinho de lá, pois ninguém mora em Jerico, é lugar de passeios, apenas. Vou gostar de te levar até lá,… se você aceitar o convite e um dia quiser ir ao Ceará”. Aí ouvi aqueles meus dois amigos esquilos cantando: olha que isso aqui tá muito bom, isso aqui tá bom demais…Mas consegui responder “você vai me convencer, ,mas sou um grande preguiçoso para viajar”…O elevador chegou no quinto andar. “Vamos ter que combinar isso. Vais lá abrir a porta? Te espero aqui..”. Fui, destranquei a porta, me dei um beliscão, e voei pro elevador.

Entramos e reiniciamos a viagem: “Espero que gostes do apartamento, é igual ao que eu moro, pequeno, sem luxo, mas bem confortável. E a localização é ótima, fica perto de tudo, cidade pequena é bom por isso”. Ela não disse sim, nem não, revelou que seu trabalho exigia viagens constantes e na maioria para grandes cidades “Mas também gosto de cidades pequenas, a vida rola com menos correria, as pessoas não são tão frias, distantes. Eu estou vindo de Nova Iorque, morei lá um ano, foi muito bom,…mas lá é um deserto….não de areia, de pessoas frias e indiferentes” E me olhando rindo, acertou na veia: “Tomara que eu goste daqui, pelo menos comecei bem, você é uma grata surpresa”. Respondi “também estou feliz por ter arranjado uma amiga cearense! Isso aqui está parecendo sonho, mas já me belisquei e não é ” . Rimos alto.

Aí ela tirou a máscara e mostrou os lábios, a boca,…achei que estava chegando no céu…Ela falou primeiro “então chega de conversa e vamos ver esse apartamento”, disse. “Me dá as chaves que eu abro a porta”, me ofereci. Ela abriu a bolsa e me deu as chaves. Fiquei olhando para aquela boca iluminada por dois olhões verdes… E pensei se eram só as chaves do apartamento….ou se eram chaves de outras portas. Entramos no apartamento e ela logo gostou, achou bem ventilado, com uma bela vista para a cidade. Depois me contou que foi atriz e trabalhou no Hair. E disse que com alguns homens foi feliz, com outros, foi mulher…foi só aí que notei que as garras da felina me marcaram o coração. Era uma tigresa! E só até ali já havia levado embora toda minha inspiração …. Então, o voo pousa bem aqui. É lógico que foi excelente, a melhor viagem de elevador que eu já fiz! Mas a continuação do voo vai ficar para outra viagem….

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