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18/05/2020 às 10:22
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Quirera Gourmet – 18/05/2020

Quirera Gourmet

Registros de um rapazote que estudava no La Salle

Saudades de ir a pé para aula de manhã bem cedinho na rua de terra gelada, ouvindo o cróc-cróc do sapato esmagando a geada grossa, que “crescia os barrancos”. E dar orgulhosas “baforadas” no frio, como se fumasse, com o pescoço tapado por manta e cabeça com touca de crochê que Dona Alice fazia. Era bom andar naquele sol delicioso, com as mãos no bolso e a pasta debaixo do braço. Subia o morro da La Salle, encontrava colegas no caminho, todos quase irreconhecíveis, encapotados e envelopados com blusas ou jaquetas de lã ou de couro… e chegava no colégio. As oito horas tocava a sineta e todo mundo se alinhava no pátio em filas separadas da primeira à quarta série do Ginásio. Organizada a fila o irmão mandava todos seguir até a sala, em fila. Na sala cada um tinha sua carteira e sentava no mesmo lugar. A carteira era dele! A aula começava com a chamada e a maioria respondia “presente”. Os mais engraçadinhos e abusados faziam gracinhas tipo “cheguei”, ou “tô aqui, fessor”. Quando um não estava alguém respondia ”não veio”! O Colégio La Salle tinha um “modus operandi” quase militar, talvez porque estávamos em plena ditadura – fiz o ”ginásio” entre 1965 e 1968. Na semana da pátria, além de formar filas antes de entrar na sala, todos “em posição de sentido” cantavam o hino nacional.

Exercício de leitura

Na aula de Português da primeira série tinha exercício de leitura, em voz alta, para toda a classe. Cada aluno lia um trecho e os demais ouviam e ao mesmo tempo que acompanhavam no livro. Se o que estava lendo errasse alguma palavra, choviam correções, em voz alta. E voltava a leitura. O professor corrigia o leitor quando ele errava a pronúncia de alguma palavra…e isso provocava risos e brincadeiras, mas não era bullying. Depois de quarenta e cinco minutos vinha o recreio e todo mundo corria para o pátio. Tinha cantina, com paçoca, maria-mole, pastel e “gasosa” do Soccol ! Coca-cola e grapete eram artigos raros, e caros! A maioria trazia a merenda de casa – o dinheiro era controlado, apesar de todos serem filhos “boas famílias” da classe média. O lanche de casa era sanduíche, um pedaço de pão-de-ló, bolachas caseiras ou laranjas, vergamotas e um Q-suco! No recreio dava para jogar pingue-pongue, mas a maioria conversava em rodinhas no sol, ou jogava “meia linha”, ou cobrava pênaltis, em duplas, na cancha de futsal de cimento, recém construída. Aí já dava para tirar agasalhos, o sol tinha derretido a geada e a grama já não era mais verde…

Aviso na caderneta

Na volta à sala de aula, o aluno previamente escolhido havia carimbado, “na hora do recreio” a caderneta que todos tinham que levar sempre na pasta. Nela, além do carimbo de “presente”, tinha espaço para anotações, tanto de pais quanto de professores. Um algum “aviso” escrito o aluno tinha que colher a assinatura, ou o “visto” ou do professor, ou dos pais. Os “avisos” e geralmente não traziam boas notícias para os alunos. Um dia não “estudei os deveres de casa” e disse para o professor que não deu tempo. E lá foi aviso para casa: “O professor quer saber porque não estuda as lições ”… Mostrei para mãe e no dia seguinte apresentei a caderneta ao irmão, com a resposta dela: “Esqueceu por vadio, mas não por falta de tempo. Peço por favor obrigar ele dar a lição. Agradece. Alice”. Minha mãe em assuntos de escola era jogo duro! Em agosto de 1965 o Professor, Irmão Alóis, parou uma aula ”de ciências” e mandou abrir as janelas para a turma conhecer um fenômeno raro : Caía NEVE! Foi assunto por meses… com isso a aula (das 11 às 11:50) foi suspensa e descemos o morro em guerra de bola de neve – a única que fiz até hoje! A nevada foi tão forte que deu para fazer boneco de neve, ao meio dia na praça Tiradentes, que nem tinha nome e servia como campinho de peladas, comícios e acampamento de circos…

Mascote do colégio

Em agosto tinha que “ensaiar a marcha do dia sete”. No dia da pátria, os colégios La Salle (dos irmãos), Educandário São José (das freiras) e Joaquim Nabuco (escola pública) desfilavam garbosos, cedinho, na Passos Maia, todos devidamente uniformizados. Os ensaios com os alunos enfileirados marchando – eram em horário de aula no campo do colégio ou nas ruas das redondezas, com banda tocando, para ensaiar também. O irmão Eriberto comandava: “esquerdo, direito, esquerdo, direito”! Nos pós desfile, vinha a discussão sobre “quem ganhou” – um concurso fictício para conferir qual dos colégios fez o desfile mais bonito…A banda do La Salle, com grandes bumbos, tarolas e até “cornetas” sempre era a melhor equipada. Outra atração eram as bicicletas – artigos de luxo numa cidade com paus de amarrar cavalos em frente a loja, sapataria, açougue, padaria ou armazém – o comércio da época. Para o desfile as bicicletas (coisa dos mais ricos) tinham suas rodas decoradas com faixas coloridas de papel crepom, que dava um visual de carnaval, eu achava. Um dos desfiles foi traumático para mim: Fui escolhido para ser “mascote” do La Salle, e sofrendo de uma timidez invencível, não tive como dizer não: Virei aquela pobre alma marchando sozinho à frente da banda – que abria o desfile do colégio. E na frente de uma multidão que lotava a Passos Maia! Morri de medo de marchar rápido demais (para acabar logo) e ficar muito na frente da banda. Não podia olhar para trás! Mas no fim deu tudo certo, e, segundo consta, o La Salle “ganhou” o desfile, como sempre!

Pescarias e festinhas

Depois do desfile do dia sete o frio já estava indo embora, mas não tinha tristeza: Começava a “temporada” de pescar e caçar rãs, nas margens do Rio Xanxerê, do Nabuco até a hípica, passando pela Eletrosul (que nem existia) e subindo o rio até as terras da família Boni, no Passo trancado. Ou, Rio Xanxerê abaixo, da pedreira do Westerich até o Moinho do Seu Antero dos Santos, lá em baixo. E mais os banhos também no Rio Xanxerê, no “pocinho do grupo”, mais raso, ou no perigoso “poção do Giordani” (onde hoje está o Super Brasão), mais fundo e onde os mais corajosos mergulhavam pulando de cima da “árvore do Tarzan”! As pescarias só acabaram lá por 1967-68. Aí os domingos à tarde, depois do bang-bang no Cine Luz, passaram a ser de outra atividade excitante: Festinhas ao som de músicas da “jovem guarda” na casa da família de alguma menina bonita – que tinha um toca-discos, ou eletrola! O desafio era “dançar de rosto colado” – um grande feito para rapazes valentes, e bonitos, é lógico! Tímido, eu dificilmente dançava, ficava mais “secando as gurias”… Até agora ainda não vivi, nem vi, nada melhor que essas vivências – sem sofrências – daqueles tempos de aventuras imortais. Não tenho do que me queixar! Mas queria de novo…

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