Vontade é uma fome que dá nas gentes. Tem vontade que dá e passa, tem as que não saem da cabeça, tem as vontades da moda, e as que não tem nem pé nem cabeça. A gente vive porque tem vontade, embora muitos não tenham nem uma coisa nem outra: nem vida, nem vontade. É a vontade de sumir do mapa. Grávidas têm estranhas vontades, fora de hora e de qualquer propósito. São as vontades da vida que está se preparando para colocar o pé na estrada, ir pro mundo. E ser escravo de suas vontades. Há vontades intraduzíveis como a fome de alguma comida que não sabemos o que é. A fome é uma vontade muito interessante, é uma das que mais mata. Ter crianças morrendo de fome hoje no mundo é algo que dá vontade de morrer de vergonha! A fome é uma vontade que foi menosprezada, tratada com preconceito, ignorada e aceita como algo normal.
Mas anormal, nos dizem, é a vontade de matar ou de morrer. Vontade de comer a fome é um desejo que deveria ser possível, se houvesse justiça entre os homens. Mataria a fome, ela mesma viraria alimento…Vontades utópicas, sonhos, delírios. Tem gente que viaja e vive nesses sonhos “de boa”. São cidadãos do mundo, vivem no mundo, em qualquer lugar. E há outros que têm o mundo dentro deles e, poucos percebem, são os donos do mundo. Ou, pelo menos, têm vontade de ser! Resumo da ópera: Deveria ser possível matar a fome, assim como a gente mata a vontade… Assim como a gente mata as gentes!
Queria voltar por algum tempo ao Egito para assistir a construção das pirâmides. Voltar no tempo e ver a muralha da China sendo erguida… Não dá mais para aceitar a escravidão do homem pelo homem, muito menos as guerras, homens matando homens (e mulheres, e crianças). Mas, tristemente, não há como negar: a escravidão, a exploração da mão-de-obra escrava, dos derrotados nas guerras, dos pobres e dos excluídos foram as ferramentas e a “tecnologia” que nos trouxeram até o século XXI. Até onde esse “mecanismo” vai nos levar, se levar, é uma temerária e tenebrosa dúvida.