Em dia de eclipse solar as nuvens resolvem roubar a cena? Agora são onze horas de segunda-feira e falta pouco para o eclipse tapar uns 60% do sol, segundo disseram. No último eclipse solar que lembro um amigo olhou para o relógio, que marcava 12 horas, mas estava tudo escuro e ele não teve dúvidas: É meia noite, vou pro Salão Paris, ver as tias! Mas era meio dia de um dia de eclipse total, escureceu tudo, as lâmpadas das ruas acenderam e o amigo aproveitou a deixa! Mas em tempos de terra plana, esse eclipse de ontem deve ter causado pavor em muitos pecadores que aguardam ansiosamente o fim do mundo, para dizer “eu avisei”. E se fosse mesmo o fim do mundo também teríamos muitos profetas avisando que já sabiam. E mesmo não sendo profeta nem pecador é válido dizer que neste ano da peste nada mais será capaz de nos surpreender.
Perdi mais da metade da mania de me queixar, mas volta e meia ainda me deparo comigo mesmo pensando ou escrevendo ideias e opiniões que não recomendaria. Como essa de reclamar das nuvens que roubaram o eclipse. Faça o que eu digo, não faça o que eu faço – dizia-se antigamente, nos tempos do autoritarismo. Porém, hoje mais que nunca cada um faz o que quer e muda nada dizer faça o que eu digo. Então melhor dizer, faça o que bem quiser! E não precisaria dizer isso também, porque para se fazer o que achar melhor é desnecessário aconselhar. É coisa de gente intrometida, ou de quem não tem o que fazer! Também ouvi muito que se conselho fosse coisa boa, ninguém dava de graça! Posentão vou virar o disco e ao invés de dar conselhos mudo o repertório para jogar palavras ao vento, falar com as pedras, chamar a atenção dos passarinhos…
Sempre me patrulho sobre estar ou não escrevendo palavras vazias, sem nenhum conteúdo, ocas por dentro e por fora, sem qualquer sentido. E gosto de pensar que as palavras que dizemos ficam flutuando no ar, ao nosso redor, esperando a melhor hora para desabar sobre nossas cabeças feito arranha-céus em tsunamis sertanejos… Nos tempos atuais, tudo é possível, e nesse ano, mais ainda! Mas tenho obsessão por saber o que acontece com as palavras, tanto com as que jogamos para fora da boca como as que engolimos, até sem querer. E se me faltarem as palavras terei que aprender libras, a linguagem dos sinais. Isso se ainda tiver vontade de dizer qualquer coisa. Ainda não surgiu nenhuma moda, onda ou mesmo um aplicativo que pregue e glorifique o silêncio absoluto. Hoje em dia predomina a vontade de se mostrar, ostentar e exibir incansavelmente que somos inteligentes. Além de ricos, bonitos e famosos, é lógico. Manter-se calado também é uma prática, porque o silêncio às vezes vale ouro, dizem.
Por mais que em bocas fechadas não entrem moscas, às vezes vomitamos impropérios com milhares de moscas, pois a raiva é péssima conselheira. Mesmo que o ódio esteja mais na moda, e que o amor esteja na lista de animais sob risco de extinção, melhor nem falar mais nada. Tudo o que precisava se dizer já foi dito, incluindo as meias palavras e não há mais nada de novo sob os céus da Dinamarca. Além disso, o olhar do meu pai dizia muito mais que mil palavras, ele nem precisava falar. Assim, estou fortemente empenhado em difundir e divulgar o valor do silêncio absoluto, ainda que me restem dúvidas: Será que alguém vai conseguir decifrar esse mutismo total? Porque mesmo com a ausência de qualquer som que imite palavras ou letras a gente precisa no mundo de hoje se comunicar – pelo menos isso é o que sempre escuto e leio por aí…
Já deu quase meio dia e nada de eclipse solar. Já imagino alguém lendo isso e sentenciando: É pura falta de ter o que fazer! Vai carpir um lote que você ganha mais! Poderia até seguir tal conselho, mas ele veio de graça, não deve valer grandes coisas. Assim mesmo, a preocupação continua. Disseram que outro eclipse assim só daqui uns 50 anos – o que permite supor que no próximo eclipse a gente esteja assistindo tudo do lado de lá. Ou num outro mundo que ainda não nos foi apresentado formalmente, mas imaginamos existir. Melhor pensar que neste ano nem eclipse dá certo! Quem sabe no próximo, olhando pelo outro lado, a gente consiga ver não só o eclipse, mas como ele se comporta ao ficar escondido pelas nuvens. Vai ver esse eclipse de ontem não era adepto da ostentação e prefere agir somente por trás das bombas. Seria um eclipse na moita total. Só para contrariar.
Contudo há que se reconhecer o mérito deste “munheiro” de quireras: tentei, honestamente, transmitir com todas as letras um eclipse solar. Sem rodeios confesso que não me faltaram as palavras. Veio a faltar foi o eclipse mesmo! E para contentar um pouco os negativistas de plantão, lhes digo com absoluta certeza: Não teve eclipse e nem coisa alguma! Foi apenas uma manhã nublada e indefinida, tipo aquelas coisas que servem para nada, como as vacinas, por exemplo! Além do mais, vamos combinar: Em terra plana é totalmente impossível haver eclipse solar. O dia só escurece mesmo à noite, quando o sol cruza por baixo da terra plana – o que não quer, por enquanto, dizer que o sol esteja deitado e morto. E é preciso que isso fique bem claro, antes que alguém venha dizer que mataram o sol! Depois dessa acho melhor mesmo difundir e propagar o silêncio. O silêncio ainda existe, dizem!
Posso não concordar com uma só palavra do que dizes. Mas defenderei até a morte o teu direito de dizê-las. Tal lição de moral é atribuída, se não me falha, a Abraham Lincoln, considerado um dos grandes responsáveis pela tal Democracia, invenção, ou tramoia, atribuída – na versão atual – aos Norte-americanos, os reis do planeta. Palavras são a matéria prima de infindáveis e intermináveis escritos, tratados, debates e descobertas, desde as científicas até as antropológicas, cósmicas ou históricas. Palavras podem causar tsunamis e até eclipses. As palavras são impossíveis, inimagináveis e infinitas. Palavras, palavras, palavras…você só fala promete e nada faz! Assim cantou Gonzaguinha ao lembrar que “cantar/ nunca foi só de alegria/ com tempo ruim/ todo mundo/também dá bom dia”!
Um bom dia e uma boa semana a todos (as).
Em tempo: Ao menos aqui na minha janela o eclipse não deu as caras! Gente que não tem palavra é sóda!