Sou pai de três filhas adultas e as melhores recordações delas serão, para sempre, do seu tempo de criança. Sempre gostei muito de crianças e jamais vou esquecer o que o pediatra da minha filha mais velha me disse, ainda na maternidade, ao colocá-la no meu colo: ”Segura a sua filha. Algo para você nunca mais tirar férias”. Era pura verdade e descobri isso naquele mesmo instante. Outra frase que me ensinou muito, e ajudou na educação delas, veio de um pediatra: “Criança não é adulto pequeno. Criança é um ser totalmente diferente de pessoas adultas”. Também a mais pura verdade, e para entender as crianças a gente precisa voltar a ser criança também, eu acho. Essa parte igualmente me agrada muito, pois jamais esqueci do conselho para “jamais deixar morrer a criança que vive dentro de nós”. Hoje às vezes penso que minhas filhas se esqueceram do pai. Mas eu continuo não tirando férias delas…
Uma leitura quase obrigatória para minha geração lá pela década de 1970, foi o livro “O Profeta”, de Kalil Gibran. Nele, um dos muitos pensamentos dizia, mais ou menos, que “nossos filhos não são nossos filhos! Nossos filhos pertencem ao mundo, ninguém deve se achar donos deles”. Igual a muita gente ali na faixa dos 20 e poucos, eu também achava que os pais mandavam demais na gente, e a frase de Gibran me alegrou, pois eu não queria me considerar uma propriedade de meus pais…Em férias da faculdade voltei para casa com “O Profeta” debaixo do braço e, só para provocar minha mãe, uma italiana apaixonada pelos sete filhos, li para ela, sentadinha no sofá da televisão, a frase do Gibran, só para sentir sua reação. E veio dela uma resposta que até hoje lembro, com som ao vivo e a cores, e me faz rir: ”O quê??? Bruto senza vergonha! Você é bem meu filho, sim senhor viu??? Te carreguei nove meses na barriga?!!”…Minha mãe era disciplinadora, mas sempre muito doce…saudades!
Ao observar o tipo de relação entre pais e filhos (as), hoje – as minhas e as (os) dos amigos – é fácil ver que tudo mudou. A primeira mudança que vejo é que hoje são os pais que devem se adaptar aos hábitos e preferências dos filhos, e antigamente os filhos se adaptavam aos pais. Também não vejo os filhos de hoje com os mesmos cuidados, respeito, preocupação, e nem a mesma admiração que eu, ao menos, sentia por meus pais. Certamente eles foram melhores pais para mim do que eu fui para minhas filhas, disso não tenho dúvidas. Apesar de ter me esforçado por fazer o melhor que pude fazer, especialmente quando elas eram crianças, hoje penso que gostaria de ter feito mais, mas não consegui…Não reclamo do jeito que minhas filhas enxergam e administram seus mundos, hoje. E admiro sua independência de mim. Sempre mantive em mente que elas não eram minhas propriedades e que teriam, como têm, vidas próprias, na qual eu deveria interferir, na idade adulta, o menos possível. E preferentemente, dar palpites, ou conselhos, apenas quando fosse solicitado, especificamente para isso, por elas mesmas.
Graças a Deus e a elas, não posso dizer que minhas filhas me trouxeram problemas, ou que me deram muito trabalho. Não, elas não me fizeram ficar de cabelos brancos, nem perder os cabelos. E isso já é o bastante. Sinto orgulho delas, muito, pelo fato de elas serem exatamente como são. Tenho, ou teria, algumas críticas ou observações a fazer – parecidas com as que eu ouvia de meus pais, mas sempre que consigo (e me esforço para isso), não falo mais nada. Aliás, falo cada vez menos “dessas diferenças” com elas. São adultas, sabem muito bem o que fazem, têm a sua régua e o seu compasso para traçar seus caminhos – e isso é o que mais interessa. Sinto, é verdade, saudades de ter filhos ao redor, como meus pais tiveram. Mas… os tempos são outros, as pessoas também, e os filhos também…O mais importante para mim é vê-las cuidando bem de suas vidas, trabalhando e lutando suas lutas com garra e dignidade. E também tenho conseguido me desapegar delas, pois percebo que já estão bem longe, bem diferentes, das menininhas que ajudei a criar…Que sejam felizes. E se precisarem do pai, elas sabem que sempre estarei disposto a ajudar! Sem tirar férias!
Também parei de perguntar ou dar a entender que gostaria de ter netos. Isso sem dúvidas é uma intromissão indevida e que ninguém, eu acho, deveria praticar. Até engravidar pela primeira vez uma namorada eu vivia dizendo que não queria ter filhos. Mas depois que nasceu a primeira, passei a ter outra visão do que era ser pai. E assim entendo que, no caso de eventuais netos, seria a mesma coisa, em relação a ser avô. Hoje para mim o que tem mais valor, em relação às minhas filhas, é lembrar delas crianças, brincando, sorrindo, descobrindo o mundo. Igual ao que eu fiz e vi minhas filhas fazendo, aprendendo a viver. Mas as crianças sempre irão exercer em mim uma atração inigualável. Talvez por isso defendo pena de morte ou prisão perpétua a adultos violentos e agressores de crianças. Esse crime hediondo para mim é o pior de todos, e deveria ser punido exemplarmente, sem dó nem piedade. A covardia de alguém que abusa de uma criança retira dessa pessoa o direito de conviver em sociedade. Não merece e não poderia, nunca mais, viver em liberdade!
Muita gente pode considerar inapropriado falar em violência contra crianças no Dia da Criança. Mas acredito que por mais que se fale, que se proteste e se denuncie este vergonhoso acontecimento, em pleno Século XXI, ainda será pouco para combater a barbárie que isso significa. Dizem os entendidos que em muitos casos de abusos contra crianças o abusador provavelmente sofreu o mesmo crime, na sua infância. Mas nem isso – se é que é verdadeiro- serve nem para amenizar, nem para explicar, muito menos para justificar abusos contra crianças. Não sou a favor de pena de morte, em muitos casos de crimes hediondos. Mas não teria dúvidas, se fosse um juiz e se essa lei existisse, em decretar a pena máxima para tais monstros, covardes e seres totalmente indignos de viver numa sociedade. Numa sociedade fria, indiferente – diga-se bem a verdade – que usa agora a sua mais evoluída invenção, a Internet, para disseminar a pedofilia, no mundo inteiro. O Ser Humano é muito condescendente com seus próprios crimes, especificamente nesse tipo de crime!