As duas primeiras décadas do Século XXI não deram sossego, nem sombra e água fresca. E seria justo que, após vinte séculos ou dois mil anos decorridos de nossa nociva presença, os mais inteligentes e destemidos animais jamais vistos pudessem usufruir de um planeta, digamos, mais domesticado, pacífico, e ainda mais hospitaleiro. Mas não é o que estamos vendo. Nem com mortífera Pandemia e nem com o anunciado, e não registrado, novo normal, a nossa sociedade humana dá mostras de ter encontrado o caminho da paz. Da prosperidade, apenas para alguns… E nem existem sinais de que estejamos evoluindo. Ou melhor, os sinais existentes apontam claramente que estamos regredindo.
As guerras seguem ameaçando matar milhares, ou a todos e a todas, com as mesmas armas e as mesmas bombas que usamos há mais ou menos um século atrás. Os grandes líderes das tribos mais poderosas seguem, dizem, em buscam da paz. E conversam, até em várias línguas, mas não se entendem em nenhuma delas. A Ciência, cabe reconhecer, segue avança e traz inimagináveis confortos. Mas em compensação as religiões em sua maioria retrocedem e, ao invés de proteger seus rebanhos, passaram a espoliar e a empobrecer as ovelhas. E apelar para o ultrapassado e falso fanatismo religioso, espalhando medo entre os fiéis, quando deveriam ensinar a eles o caminho para a vida eterna….
De cima desse monte de Quirera, e com a cara pintada de pó de milho amarelo, enxergo um Brasil que julgava não existir mais desde a idade média, há uns 15 séculos atrás. O Século XXI rodou nem 30% da sua fita e, mesmo não sendo especialista em século XX, penso que lá por 1921 – mais ou menos – o mundo era mais feliz e mais humano, penso eu. Em 1921 sequer existia a ameaça da Bomba Atômica – que destruiu duas cidades e matou, numa tacada, mais de 200 mil japoneses. Em 2021 a Bomba Atômica virou inocente bombinha de São João, perto do arsenal mundial disponível e ostentado – hoje com capacidade para destruir japoneses, chineses e todos nós, por várias vezes – se for o caso. E há cem anos atrás ainda existia um sentimento que – garantem os especialistas disponíveis – hoje, só se tem com muito dinheiro – e às vezes nem assim. É um tal de amor às pessoas, uma tal solidariedade gratuita e sem esperar nada em troca. Essa, o gato do Século XX, comeu!
Algumas das mais graves doenças que já existiam em 1921 continuam sem cura, embora a maioria delas já tenha remédio. Porém novas doenças letais surgiram, e não se tem cura para elas, ainda. A segurança das famílias e das pessoas tornou-se um problema seríssimo, porque a polícia, mesmo gastando montanhas de dinheiro não consegue estancar a expansão da bandidagem, nem da roubalheira, da má-fé e muito menos da corrupção. Agora temos ainda o tráfico de drogas – que se transformou num dos mercados mais ricos e disputados do planeta. Suspeita-se – com crescentes certezas – que a guerra às drogas esteja acontecendo em trincheira errada: A dos pobres. E na verdade corre solta na trincheira dos mais ricos e poderosos! Culpar os pobres pelas mazelas sociais das drogas é algo novo! Embora “botar a culpa na pobreza” já fosse moda lá em 1921…
No início do Século XXI consolidou no planeta a sensação de que matar inocentes e vulneráveis, de crianças a idosos, passando por mulheres, negros, gays e de novo, pobres em geral, faz parte! Deve ser porque são muitos e, pelo menos os pobres não param de crescer! Mata-se a torto e a direito e temos inclusive líderes tribais incentivando seus índios a comprar armas, mais que comprar livros, ou mesmo alimentos! Se realmente existirem outras formas de vida nos observando, mundo a fora ou em outros mundos, a imagem que podemos fazer deles mostraria sua incredulidade com o que estão vendo quando olham para nós. Devem balançar a cabeça, cruzar os braços e murmurar “isso não tem mais jeito, só piora”!
Há mais de cinquenta anos o bicho mais inteligente do planeta convive com a certeza de que existem alimentos e recursos suficientes, e até de sobra, para acabar com a fome e com a miséria de todos “os irmãos”. Mas ninguém jamais tentou, a sério, fazer isso! Já as tentativas de acabar de vez com a pobreza, matando de fome e/ou à bala, acontecem à toda hora, em muitos países! Inclusive num, do hemisfério Sul do mundo, considerado por muitos quase como um provável paraíso terrestre, não fosse a raça de gente ruim que o habita e, especialmente que o comanda. Nele, com o discurso de acabar com a corrupção, institucionalizou-se a fancaria e a mentira. Retrocedeu-se até mesmo no combate à corrupção, que dizem ter acabado – mas só porque ninguém mais quer combater, só usufruir dela….
E, ao mesmo tempo em que “as coisas” não melhoram, nota-se um gigantesco aumento, um verdadeiro boom planetário de apelos, súplicas, pedidos e promessas aos deuses, para que eles interfiram e acabem com as desgraças geradas, cometidas, permitidas e fabricadas pelas mesmas mãos humanas que se juntam para orar, todos os dias, a toda hora, em todo lugar! Acredito que os deuses, em vinte séculos, jamais tenham sido tão lembrados quanto foram nestes primeiros 21 anos do Século XXI. Li esses dias que à medida em que a Ciência avança em seus conhecimentos e descobertas, mais os deuses deixam de ter o que fazer, ou de serem responsabilizados por situações, em que a inteligência humana não consegue explicar. E alguém deve ter contado isso para o crescente rebanho que insiste em pedir mais e mais, todos os dias, as benesses vindas ou doadas pelos deuses. Dá a impressão que vazou informação dando conta que “os deuses andam meio de folga”…
Ontem, em caminhada de quadra e meia pelas ruas centrais de uma simpática cidadezinha do Oeste catarinense, no Sul do mundo, fui premiado com dois panfletos de igrejas, convocando para rezar. Além de ser cumprimentado e convidado a parar para conversar com um suposto pastor – imagino eu – que deve ter lido nas estrelas que eu estaria desanimado, ou desiludido com a vida. Sem que eu abrisse a boca ele me aconselhou a levantar a cabeça e seguir em frente, e a acreditar! Porque o seu Deus haveria de me conduzir para o caminho das luzes e me livrar de todo o mal…Educadamente respondi que eu não estava de cabeça baixa, nem desanimado, e que jamais fui de desistir, nem de entregar os pontos! Ele me olhou assustado, mas continuou louvando seu Deus. E eu então resolvi sugerir que ele transmitisse ao seu Deus que está na hora dele escolher melhor seus pastores! Ou vai acabar ficando sem ovelhas! E voltei para casa, louco de vontade de moer Quirera!