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08/06/2021 às 06:31
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Quirera Gourmet – 08/06/2021

Quirera Gourmet
Por: Romeu Scirea Filho

Os Botões, Mais Eu

Reinventar a rotina passa por emagrecer, voltar a pegar o violão, ter horários para leitura e para andar na rua…depois dos 60 e aposentado, o desafio de fazer coisas novas ou simplesmente fugir da mesmice é um grande desafio. A tendência natural para a acomodação e para curtir o “dolce far niente” é atraente. Mas é preciso ter respostas interessantes para a pergunta ‘o que você faz para passar o tempo? ’ Neste primeiro ano e meio de aposentado não me preocupei em traçar planos, nem listas de metas a cumprir – “chatices sérias” que nunca consegui nem fazer, quanto mais cumprir.

Mas aos poucos enxerguei que deixar de andar nas ruas, conversar com dezenas de pessoas, ir a lugares diferentes e ouvir e falar sobre assuntos diversos, diariamente, – “rotina” de repórter que trabalha na rua – faz falta e deixa um enorme vazio na agenda do dia, da semana, do mês… É preciso ocupar essa cratera com alguma coisa. E escrever não cabe nesse vazio, porque era tarefa regular, antes. Porém, talvez, espero que sim, com essa nova agenda a ser desenhada surja vontade e disposição para – depois de décadas de promessas solenemente ignoradas – escrever um livro de contos e causos, reais e imaginários.

A última grande desculpa para não cumprir essa velha promessa tem sido o fato que ser notório o desinteresse de muitos, da maioria, em ler qualquer coisa – e principalmente livros. Sempre fui muito competente em encontrar e usar desculpas esfarrapadas para não cumprir planos e metas. Meu tio Nilson Periolo, médico, legítimo apreciador das coisas boas da vida, é o autor do provérbio, para mim Chinês, que diz: ” Eu tenho dois defeitos…Gosto de mulheres rápidas e de cavalos lerdos…Perco dinheiro com os dois”! Ele apreciava, adorava, cavalos de corrida. E sempre disse e cumpriu uma promessa: jamais se casou, nem teve filhos…

E é dele também uma outra sentença – essa sobre eu mesmo – que nunca esqueci, desde os tempos em que tentava o vestibular para Medicina e morava na casa dele, com outros irmãos meus: “ Você também tem dois defeitos: É pobre e não tem vontade de trabalhar…isso é: tá f(*)dido!”. Tio Nilson tinha um invencível bom humor, mas na primeira vez que ouvi isso dele, gostei nadica. Depois, com o tempo, comecei a aceitar que não eram exatamente, nem totalmente um erro, as “qualidades” que ele enxergou em mim.

Anos mais tarde, quando decidi abrir mão da Faculdade de Medicina e fazer Jornalismo, voltei a pensar no que ele me disse. Realmente eu não tinha vocação para me matar de trabalhar, nem de estudar muito, para ganhar uma montanha de dinheiro. Essa não era, nunca foi “a minha praia”. Tanto não era que jamais senti uma linha de arrependimento por trocar de profissão. E tenho ainda bem nítida a sensação que tive, quando passei a estudar para virar Jornalista: Tirei um enorme peso, uma grande pedra das minhas costas. Foi, e é um grande alívio!

Ser médico, tratar de vidas humanas, era muita areia para meu caminhãozinho. Não tenho sangue frio, nem conseguiria ter dedicação exclusiva, 24 horas por dia. Essa era a imagem que eu sempre fiz da Medicina – para cuidar da vida de pessoas com problemas de saúde. Ainda na Faculdade de Medicina, ao ter aulas no hospital e conversar, acompanhar doentes internados, tive total clareza dessa grande responsabilidade, que eu não tinha: No final das primeiras aulas práticas no hospital, que ficava doente era eu…

Ficava deprimido ao ver aquelas pessoas, pálidas, com olhar perdido, longe de suas casas, andando pelo corredor do Hospital de Caridade com a garrafinha de soro pendurada no suporte, que levavam na mão. Sentia, sim, vontade de ajuda-las. Mas na minha cabeça aquilo causava uma grande tristeza, e logo saquei que não aguentaria conviver com esse cenário, todos os dias. E mais: Se algum deles viesse a morrer, com certeza eu me sentiria culpado, por mais que tivesse feito tudo o que era possível. Daí resolvi, Medicina não era para mim!

Ao mesmo tempo, com notas ruins na faculdade, notei que lia muito, revistas, jornais e outros livros, mas não os de Medicina. Isso mesmo tendo um dedicado e estudioso colega de faculdade morando junto, na república, jamais consegui estudar com ele. Hoje ele, Ricardo, é um grande especialista em reprodução humana e professor de Medicina, na Ufsc. Na verdade, gostava mais da companhia do Serginho Paulista, outro colega, um exímio, maior craque que vi e ouvi, com um violão nas mãos. Filho de maestro e autodidata, “Paulista” tocava “de ouvido”. Era só decorar a letra e saber cantar que ele acompanhava, qualquer música.

E eu sempre gostei de cantar… Pouco antes de eu desistir da faculdade, Paulista me avisou: “Romeu, guardei o violão dentro do estojo, em cima do guarda roupa. Se não, daqui não vai sair médico”! Sérgio concluiu o curso de Medicina e voltou para sua terra, no interior de São Paulo. Há um ano descobri que virou político e se elegeu prefeito de uma cidade paranaense, na divisa com São Paulo. Dele, guardei deliciosas rodas de viola comandadas por seu afinadíssimo violão. Nunca mais encontrei alguém que chegasse perto da sua virtuose no violão. Nem que “tirasse” no violão a música “Gota D’água”, do Chico, em menos de meia hora….

A decisão do Paulista de aposentar o violão também me ajudou a descobrir “minha praia”. Se ele, tocando tudo aquilo – algo que ele adorava fazer – desistiu da música para terminar a faculdade…eu teria que superar muitos e para mim intransponíveis obstáculos até virar médico. Foi, também, um sinal que me ajudou a desistir da Medicina. Não queria, e jamais seria um mau médico. Longe de mim a culpa de um erro que tirasse a vida de alguém. E já no início da faculdade de Jornalismo eu costumava dizer: “Prefiro ser um Jornalista mediano do que um mau médico”. E acho que assim foi mesmo!

Porém, desistir de uma faculdade de Medicina em 1979, para muitos não foi uma atitude inteligente, nem fácil, para eles entenderem! Especialmente pelo horror que isso causou em quem jamais conseguiu “passar no vestibular de Medicina” – talvez o maior sonho de consumo da rapaziada da época! Medicina dá dinheiro, Jornalismo, não, todos diziam. E era verdade, mas isso não me preocupou: Eu estava fazendo o que sempre quis fazer! Apenas demorei um pouco mais para descobrir! Chegaram a me chamar de volta, na Faculdade de Medicina, para dar explicações e, quem sabe me convencer a não fazer aquilo.

Não dei bola, não quis conversa, nem respondi. Eu sabia o que queria. E ainda sei. Até hoje eu falo: Se minha meta de vida fosse ganhar muito dinheiro, jamais teria desistido da Medicina! Agora, aposentado, mas sempre gostando muito de escrever, preciso me reinventar, de novo! Não vai ser uma reinvenção tão drástica, nem vou precisar fazer novo vestibular… mas “já está dando o que falar” – e isso também era esperado! Bora nós!

 

 

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