Atendendo a uma ação civil pública ajuizada pelo Ministério Público Federal (MPF), pelo Ministério Público de Santa Catarina (MPSC) e pelo Ministério Público do Trabalho (MPT), a 2ª Vara Federal de Chapecó determinou, ainda no sábado (6), por meio de liminar, que a União transfira imediatamente todos os pacientes na fila de espera por leitos clínicos na região Oeste de Santa Catarina, para qualquer cidade do país que tenha vaga. A ideia é que pacientes clínicos e estáveis que, devido a seu histórico, venham a precisar de UTI sejam transferidos para um local que possa atendê-los.
A remoção imediata inicialmente tem que ser feita pelo Governo do Estado dentro do território catarinense, mas, caso não haja vagas, a União tem que promover a transferência para outras cidades de qualquer estado da Federação. O objetivo é manter em Chapecó, Xanxerê e região o quantitativo de pacientes que possam ser atendidos de forma adequada pelo sistema local, a fim de disponibilizar leitos aos pacientes de covid-19 que não podem ser transportados por via aérea tendo em vista as implicações respiratórias inerentes a esse tipo de transporte.
As transferências devem ocorrer nos casos que não exista contraindicação médica, conforme os protocolos aplicáveis. A região Oeste concentra hoje quase um terço dos pacientes acometidos pela covid-19 que estão na fila de espera por leitos de UTI e por leitos clínicos no estado. Quando a ação foi ajuizada, no dia 26 de fevereiro deste ano, havia 134 leitos de UTI covid e 67 pacientes na fila. Hoje, estão na fila de espera por um leito de UTI covid adulto SUS no estado 373 pessoas (destas, 174 somente na região do Grande Oeste) e 88 por um leito clínico (destas, 57 na mesma região), segundo dados deste sábado da Secretaria de Estado da Saúde.
Segundo os autores da ação, desde o início do ano, mais de 197 pacientes já foram transferidos para outros hospitais do estado por falta de vagas na região. Informam, também, que em novembro de 2020 “o MPF em Chapecó postulava que a União fosse compelida a apresentar resposta ao pedido do município de Chapecó no sentido de obter apoio para contratação de profissionais pelo Programa Brasil Conta Comigo”. Destacam que o pedido liminar foi deferido, mas o Ministério da Saúde veio aos autos e negou o pedido (ACP n. 5008920-50.2020.4.04.7202).
Demonstram, também, que, no mês de dezembro de 2020, o MPF em Chapecó ingressou com a Ação Civil Pública n. 5009611-64.2020.404.7202, “na qual postulava a contratação de profissionais da saúde para trabalharem no Hospital Regional de Chapecó em razão do aumento na ocupação dos leitos de UTI e falta de profissionais habilitados para o trabalho”. Apesar do deferimento do pleito liminar em primeira instância, houve atribuição de efeito suspensivo em decisão proferida em recurso de agravo de instrumento interposto pela União.
“As ações detinham caráter preventivo, buscando evitar a ocupação integral dos leitos destinados para pacientes covid-19. O sistema de saúde da nossa região colapsou, sendo que atualmente em nossa região não há mais leitos disponíveis para os doentes”, sustentaram o MPSC, o MPF/SC e o MPT na ação.
Diante da atual gravidade da situação, a decisão determina que o governo catarinense transfira em 24 horas os pacientes que estão na fila de espera por leitos clínicos na região Oeste para outras cidades do estado. Caso não haja leitos vagos em Santa Catarina, a União deve promover imediatamente a transferência desses pacientes para outras cidades de qualquer estado da Federação.
Ainda que não haja condições materiais e de pessoal em hospitais públicos e privados em distância exequível segundo os protocolos de remoção de pacientes, a União e o estado deverão disponibilzar novos leitos de UTI e/ou de enfermaria para o tratamento de pacientes com covid-19, mesmo que seja necessária a implementação de um Centro de Referência Emergencial e Provisório, local que deve ter estrutura de UTI e/ou enfermaria com capacidade e adequação para atender os pacientes com insuficiência respiratória aguda grave com necessidade de ventilação mecânica e os pacientes que estejam na iminência de atingir essa condição.
Os Procuradores e Promotores de Justiça reuniram vídeos e áudios de visitas técnicas às instituições de saúde de Chapecó na ação, o que, segundo a Juíza Heloíza Menegotto Pozenato, esclarece a situação caótica e desesperadora em que se encontra a saúde de Chapecó e região. “Como se vê, o déficit no número de leitos disponíveis e a inércia na imediata transferência dos pacientes que precisam de internamento nestes leitos e a consequente inobservância dos parâmetros regulamentares que disciplinam o tema é fato incontroverso nos autos”, proferiu Pozenatto.
A juíza ainda esclareceu que a decisão não ofende o princípio da separação dos poderes, na medida em que apenas busca corrigir a inobservância da legislação aplicável – obrigação da administração pública de disponibilizar profissionais de saúde conforme critérios objetivos fixados na legislação regulatória de regência.
A decisão fixa um prazo de 24 horas para o início de todas as determinações, e o descumprimento da determinação pode acarretar multa de R$ 50 mil por dia. No prazo de cinco dias, ainda, a União deve informar a respeito da existência de estudos técnicos para apresentação de plano de atendimento de urgência/emergência para grandes catástrofes ou eventualmente a respeito da própria existência de tal plano, no qual conste o planejamento específico para Chapecó e região.
Propuseram a ação o Procurador da República em Santa Catarina Lucas Aguilar Sette, a Promotora de Justiça Lia Nara Dalmutt, os Promotores de Justiça Felipe Shmidt, Maycon Robert Hammes e Michel Eduardo Stechinski, a Procuradora do Trabalho em Santa Catarina Mariana Casagranda e o Procurador do Trabalho em Santa Catarina Marcelo Goss Neves. Todos atuam na região Oeste catarinense.