Espelho quebrado

Tudo indicava que iria ser mais um dia. A rotina da sua manhã era simplesmente a mesma, quando, de repente, “paft”. O espelho caiu e quebrou-se em vários pedaços.

Imediatamente, como em um filme, lembrou-se do que havia acontecido em outros tempos, em anos já vividos há muito. O fato repetira-se. O medo, por alguns instantes, tomou conta de seu semblante, pensando que os anos passados haviam sido dificultosos e que tudo, exatamente tudo de ruim que acontecera em sua vida deu-se após outro espelho, um de outros tempos, se quebrar. Paralisou. Ficou ali, olhando os pedaços daquele objeto e imaginando os dias seguintes. Entretanto, já não era mais aquela pessoa dos anos já transcorridos, estava modificada, com a mente mais madura e resolveu, simplesmente, dar um sorriso e juntar os cacos, pensando que aquele objeto não tem controle algum sobre sua vida.

A sua rotina havia sido alterada pelo som do espelho, pelos pedaços desse objeto que teve de recolher, mas decidiu que sete anos de azar, literalmente, não teria dali em diante, pois a vida é muito mais do que um jogo de ganhar, perder ou de sorte ou azar.

Algumas pessoas podem discordar com a decisão dessa pessoa, dizendo talvez que deveria tomar algumas providências para que sua vida não fosse afetada por aquela peripécia, assim como poderia ter sido até então, entretanto, a escolha dela não foi de acreditar nesses detalhes convencionados por alguém, afinal, um espelho nem é tão caro assim!

Durante a vida, somos convidados a viver. Vivemos cada dia do jeito que escolhemos viver ou da maneira que julgamos ser melhor interagir e reagir ao mundo externo ao do nosso eu. E isso, sinceramente, não tem nada haver com sorte ou azar do indivíduo, pois se fosse por sorte muita gente não teria sido o que é hoje.

Viver implica por muitas e muitas vezes juntar os pedaços de outros espelhos que quebramos ao longo do tempo. A nossa imagem também é modificada através das escolhas e caminhos que percorremos. É comum, entretanto, ouvir jovens queixando-se do mundo e julgando serem incapazes de modificar a situação que enfrentam diariamente, pensando que tudo é como deve ser. Por falta de sorte, julgam que a vida é como deveria de ser, sem possibilidade de mudança.

Ora, se um espelho quebra, se a partir daí a imagem que é refletida nele já não é mais a mesma, é sinal que modificar a forma de agir e enfrentar o mundo. Somos frutos de um mundo em constante movimento e não de superstições.

Pensando nisso, sorrindo um pouco, concluiu ela o recolhimento dos pedaços do espelho, seguindo sua rotina, sem pensar em sorte ou azar, apenas em escolhas e vivências.